Alunos da Voz do Operário regressam a mais uma Roda do Mar

No dia 14 de junho, duas turmas do 1.º ciclo da escola da Voz do Operário, em Lisboa, navegaram rumo à Costa da Caparica, para mais uma Roda de Mar promovida pela Mútua.

“Na cultura marítima as embarcações foram de tal forma importantes na vida das famílias que qualquer dano era como se fosse uma perda na família.
Estiveram sempre envoltas em muito misticismo, tendo-lhes sido até atribuídas características humanas, tal como o “Olho de Proa”.
Acredita-se que teve origem na cultura Fenícia, com forte presença mediterrânea. Uma tradição que poderá ter 3000 anos.
O “olho de proa” é uma pintura tradicional encontrada na proa de muitas embarcações antigas. Era pintada uma forma circular na parte da embarcação chamada “Cara do Barco”.
Historicamente, acreditava-se que o “olho de proa” possuía a capacidade de guiar a embarcação até aos cardumes. (…)”
(Informação distribuída pelo “Mar de experiências” aos participantes)

Se o misticismo do “Olho de Proa” pode ter-se diluído com o tempo, como sugere o texto, não menos importância, estamos em crer, terão as embarcações de pesca para os pescadores, porquanto continuam a ser o seu ganha-pão, a sua segunda casa. E o “Olho de Proa” continua, de facto, a figurar em muitas embarcações de pesca um pouco por todo o país.

Este foi o (novo) elemento da cultura costeira trazido pelo “Mar de experiências” aos meninos da Voz do Operário, de Lisboa, com quem estivemos em mais uma sessão “À Roda do Mar”, desta vez acolhidos pela Associação Grupo de Amigos da Costa da Caparica, com uma forte tradição marítima e piscatória após o 25 de Abril de 1974, onde fica também albergada a Associação Ala Ala, de Pesca Artesanal, Local e Costeira e de Apoio Social aos Pescadores.

Duas turmas do 1.º ciclo que têm acompanhado este projeto desde 2022, e que, queremos acreditar, vão tomando o gosto pelas coisas do mar! A oficina das Lourencinhas aos 6-7 anos de idade; as Profissões do mar aos 7-8 anos, e agora este contacto mais próximo com a cultura costeira, aos 8-9 anos.

Desta vez saíram da oficia com um barco construído pelas suas mãos, e com a lição aprendida, a avaliar pelas decorações feitas, e alguns aventuraram-se ainda pela arte de “amanhar” as redes de pescas, com Mário Pedro, da Associação Ala Ala (uma das “profissões do mar” da iniciativa de 2023) que aceitou monitorizar essa oficina paralela durante a manhã.

A equipa de adultos que apoiou a sessão não teve mãos a medir às dezenas de solicitações da pequenada entre os processos de montagem e colagem das pequenas embarcações de pesca, e a sua pintura e decoração com as peças de lixo trazidas pelo “Mar de experiências”. Dali saíram barcos prontos a fazerem-se ao mar, com os seus olhos de proa, remos e redes, entre outros apetrechos… e mais tempo houvesse! Um menino confessou que estava rico porque já tinha um barco!
Depois do almoço as crianças rumaram ao mar, e conseguiram ainda com os olhos de espanto assistir à partida para a faina da embarcação de pesca da arte Xávega, “Canope”, e sua companha.

O dia terminou com uma longa conversa com os nossos parceiros de jornada, Mário Pedro e Júlia Duarte, “velhos” lobos do mar, conhecedores profundos destas artes, e o jovem Ricardo Pinto, da Associação da Ala Ala, em torno na arte xávega e dos problemas com que se debate atualmente, para persistir, apesar do estatuto que conquistou em 2017, desde que foi inscrita no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial (INPCI).

Alguns problemas são transversais a tantas outras pescarias, como o esquema de venda do pescado, que o desvaloriza desde logo na primeira venda em lota, os rendimentos baixos e incertos, e a falta de trabalhadores. Outros aspetos, como a organização dos horários das lotas para a venda do pescado, que condiciona as pescarias, ou as condições degradadas em que se encontram os armazéns de apoio, são também motivo de algum desânimo entre os pescadores.
São perto de uma dezena de companhas (pessoal de terra e de mar) que se dedicam a esta arte, que continua a ser um marco identitário importante nas comunidades piscatórias da Costa da Caparica, Fonte da Telha e Trafaria.

Fica-nos no final do dia a imagem das crianças na praia, como gaivotas, e a certeza de que o futuro lhes pertence, na expetativa de lhes aguçarmos também, com estas iniciativas, o bichinho do mar e das suas múltiplas marés.
Uma ótima forma de assinalar o final destas “celebrações” do Dia Europeu do Mar e do Dia do Pescador.

Obrigada à Voz do Operário e aos professores que participaram, Ana Cláudia, Ana Ferro, João e Sandra; e ao “Mar de experiências”, por terem tornado possível mais esta “Roda do Mar”.
Uma saudação especial à Associação dos Amigos da Costa, à Ala Ala, à D. Júlia e ao Sr. Mário, pela sua persistência na defesa desta arte de pesca e das suas comunidades, e ao mestre e tripulação da embarcação Canope.

Galeria de imagens

Ver também: Oficina de construção com lixo marinho regressa à Semana das Tradições Marítimas, em Setúbal